A saúde debilitada modificou a relação de Eurico Miranda com o Vasco. Nos últimos anos, até um elevador foi construído para levá-lo à sala da presidência sem precisar subir escadas. A morte aos 74 anos, nesta terça-feira, foi o fim de uma luta de mais de uma década contra o câncer. A última aparição pública, na reunião para aprovação das contas de 2017 (o seu último à frente do Vasco), foi em novembro de 2018, já com dificuldades para se locomover. Um mês depois, recebeu dos médicos a previsão de mais seis meses de vida.
Eurico superou um câncer de bexiga no início dos anos 2000, mas sempre se cuidou muito pouco, com seu habitual charuto e alimentação longe de saudável. Era comum jantar altas horas da noite – e até da madrugada – a cada dia, com pratos saindo de dentro de São Januário direto para a sala da presidência. Ou em encontros depois de sair da sede vascaína. No clube, pedia muitas vezes arroz de polvo, que se tornou “arroz de polvo à Eurico Miranda”, no Restaurante do Almirante.
– Ele sempre me dizia: “só não abro mão de três coisas: charuto, carne mal passada e do Vasco” – contou um amigo e correligionário do ex-presidente do Vasco.
Em 2016, Eurico fez sessões de quimioterapia para tratar o câncer no pulmão – foram mais de 10 nódulos (dois malignos) constatados. Os sintomas eram nítidos, como a perda de cabelo. Mas parecia recuperado.
Amigos próximos lembravam de explicações médicas que consideravam o câncer curado – ou menos perigoso – apenas após cinco anos sem se manifestar. Eurico não largava o charuto e, no máximo, adaptava a rotina às sessões de tratamento e aos exames constantes num hospital da Barra.
Antes dos dois nódulos no cérebro se manifestarem e debilitarem Eurico de vez, ele se dedicou à aprovação de contas no Vasco. Ia pessoalmente a São Januário e revisava números em sua sala montada abaixo da piscina do clube – para onde levou também camisas que ficavam na antiga sala da presidência. Em destaque, a 11 do milésimo gol de Romário. No fim das atividades, rezava na Capela Nossa Senhora das Vitórias. Ele próprio levou a imagem da santa e a deixava na pequena igreja do clube.
Também agiu politicamente para reunir grandes beneméritos e correntes contra a decisão judicial que determinaria novas eleições no clube em outubro do ano passado. Ligou pessoalmente para antigos aliados, como José Luis Moreira, e até desafetos, entre eles, Olavo Monteiro de Carvalho e Jorge Salgado.
Com a sensibilidade à flor da pele – não era raro se emocionar ao telefone -, mostrou humildade, pediu desculpas por desavenças e clamou por união. Resultado: entrevista coletiva com 14 cadeiras na sede da Lagoa.
De casa, Eurico ainda tentava se dedicar a uma de suas maiores distrações: jogo de cartas – tranca, que adorava jogar (e, muitos dizem, apostar também). Mesmo com dificuldades de movimentos, pedia ajuda para jogar à mesa, na cadeira de rodas.
Assim, Eurico terminou seus dias. Nesta quarta-feira, às 11h, o velório terá continuidade no Cemitério São João Batista. O enterro acontecerá em seguida. Será a despedida de um dos dirigentes mais emblemáticos da história do futebol brasileiro.
Fonte: GloboEsporte.com