Os motivos para a decadência do projeto passam pela nova péssima fase do time em campo e pelo mercado pouco aquecido, que fez até com que o último Natal tivesse média geral de venda inferior a outras temporadas no país. Mas, principalmente, de acordo com os lojistas, a falta de sintonia entre as partes envolvidas se tornou determinante para o cenário atual. A SPR virou alvo de ações na Justiça, distratos unilaterais e muitas críticas sobre fornecimento e omissão.
Na última semana, três destes locais fecharam as portas ou colocaram seus pontos à venda para evitar o acúmulo do prejuízo. Se antes o Vasco recebia cerca de R$ 500 mil de royalties (9,5% do valor total arrecadado), hoje não bate R$ 40 mil mensais – quando é repassado. O departamento de marketing do clube esteve desfalcado de um vice-presidente por 11 meses e pouco agiu no período para tentar remendar a situação, que se mostra caótica desde que a administração de Roberto Dinamite caiu em descrédito com debandada de jogadores pela grave crise financeira.
Empossado diretor do setor há 15 dias, Bernardo Pontes, sob o comando do vice Victor Ferreira, assumiu o caso, foi a São Paulo conversar com a empresa e voltou com a promessa de esforço para buscar uma solução imediata para evitar que mais franqueados abram mão do negócio.
– Já identificamos o cenário, me reuni com a SPR, estamos buscando informações e pode ter certeza de que se todos estão saindo prejudicados, o Vasco é uma parte envolvida e atingida, claro. Vamos ter um conjunto de medidas nas próximas semanas, é o que eu posso passar como posição oficial agora. Trataremos com um olhar especial aqueles que estão abertos para pensarmos no futuro. Faremos nosso dever de casa – assegurou o novo diretor.
Entre as 11 que restam, pelo menos três já notificaram a SPR e cogitaram sair da nau. A questão é que para abrir e manter a loja todos tiveram que investir entre R$ 350 mil R$ 500 mil.
– A fase do futebol não é boa, mas isso não mata o clube. O torcedor continua querendo comprar, por isso não estamos quebrados. Mas a procura é muito baixa por vários fatores, e quase todos ligados ao péssimo trabalho da SPR. Veja só: recebi uma linha inteira do São Paulo ao invés da do Vasco, o que acabou com meu Natal. Reclamei, me ignoraram, depois veio um material incompleto. E sempre chega tudo tarde, virou praxe. Muitas peças também são manchadas, é um horror. Não tive treinamento, apoio, nada em dois anos e meio. A loja era um das melhores no início. Só na inauguração tivemos duas mil pessoas aqui. Agora, já tem dois meses que não compro nada. Boa parte do estoque de 2013 segue emperrado, infelizmente – lamentou Luiz Roberto Fernandes, dono da loja de Brasília, que desistiu do projeto e vai processar.
01
Incentivo do Corinthians
A entrada da empresa no esporte foi através do Corinthians, que havia sido rebaixado em 2007. A marca Poderoso Timão ganhou força a ponto de incomodar a Nike, patrocinadora do clube paulista. Depois, com o Vasco fora da elite, houve troca de informações entre as diretorias e surgiu a indicação da franquia para alavancar a marca com novos produtos. Um vínculo de oito anos foi assinado e logo a ideia se proliferou e rendeu frutos. De cara, a SPR adiantou R$ 2,5 milhões ao Cruz-Maltino para pagar dívidas, que seriam abatidos nos lucros futuros.
O início promissor, porém, ficou para trás. Segundo relatos, outras lojas não autorizadas – físicas e na internet – vendiam material exclusivo da franquia Gigante da Colina por um preço mais barato. Há suspeita de que a empresa passou a cortar intermediários e negociar no varejo para minimizar os danos. Isso teria contribuído para diminuir o público das lojas vascaínas, já que não é possível fazer promoções sem o aval da matriz. A Penalty, que não comercializa produtos da linha da SPR em sua unidade particular de São Januário, virou a saída para os comerciantes que não querem abandonar o Vasco, mas não admitem negociar com a empresa paulista.
– Foram seis meses de negociação. Tudo muito desgastante. Emagreci 43 quilos nesse processo, embora minha intenção fosse sair de escritório para ter mais qualidade de vida. Quero continuar na loja, pois injetei muito dinheiro e, como todos, compramos um projeto por amor ao Vasco, mas desse jeito não foi possível – explicou um lojista que pediu para não ser identificado.
Outra reclamação recorrente é sobre a omissão do clube. Em reunião de janeiro de 2013, já para discutir os rumo negativo que o trabalho vinha tomando, o diretor de marketing Henry Cantfield fez uma breve apresentação e deixou o local para que os lados se acertassem, o que revoltou os investidores, que dizem que “o Vasco não abraçou a causa” como deveria quando a situação se complicou e que “não queria os pepinos do projeto”. A única ação publicitária de sucesso foi a presença de jogadores nos pontos, o que chamava a torcida atrás de autógrafos. Reza o contrato que havia um montante de 1% das vendas reservada para publicidade. Mas praticamente nada foi feito em relação a divulgação geral, como em outdoors dentro e fora do estádio.
– Há um bom tempo temos tentado vender ingressos nas lojas oficiais. E não resolvem isso. Só que outras lojas que não têm nada a ver com o Vasco ou com a
franquia Gigante da Colina vendem, aí é complicado. É um momento de reestruturação, por isso eu aposto que ainda pode dar certo – explicou um lojista que tem dois pontos que resistem às dificuldades.
02
Empresa cresce no país
A grave situação, no entanto, não se estende para outras área de atuação da parceria do Vasco. Com o nome estabelecido no mercado, a SPR fechou com camisas fortes recentemente, como São Paulo (40 lojas), Cruzeiro (10 lojas) e Inter (16 lojas), além de ter trabalhos diferentes com Botafogo e Vitória. Nenhum destes clubes vive drama semelhante. Ao contrário, tem crescido a estrutura a cada mês. O próprio Corinthians renovou o compromisso e já possui 120 pontos.
Em defesa, o representante da franquia Gigante da Colina, André Giglio, admite falhas, mas não crê que a queda das vendas e o fechamento das lojas não é responsabilidade de sua empresa.
– Não acho que houve negligência em hipótese alguma. Há pontos a serem melhorados, como sempre vai existir. Mas outras questões devem ser elencadas: mercado pouco aquecido, gestão do local, ponto comercial. O ano foi ruim, ficou aquém da expectativa, mas isso aconteceu com o mercado geral. Nesse meio é assim: você olha para trás, aprende e tenta mudar. O problema é que às vezes a expectativa do franqueado é impossível de se atender e não estão dispostos a esperar acontecer. Alguns têm outras atividades e sequer pisam na loja – argumentou.
Giglio disse ainda que a Penalty foi a culpada no caso do material do São Paulo que foi enviada por engano a Brasília. A fornecedora também presta serviços ao Tricolor. E deu como exemplo as lojas da Ilha do Governador e do Shopping Carioca, que eram administradas pela SPR mas foram negociadas com um empresário que estaria com rendimento satisfatório.
– Ele veio com a mente aberta e, digamos, sem querer ouvir as “profecias do Apocalipse”. E está dando certo, se dedicando muito, sem pensar em fechar – apontou.
03
Dirigentes levam prejuízo
Com a abertura de tantas lojas, dirigentes do Vasco também quiseram participar. E apontaram familiares para assumir o estabelecimento. São os casos do ex-vice de finanças, Nelson Rocha, o ex-vice de patrimônio, Fred Lopes, do próprio presidente Roberto Dinamite (cuja loja do Norte Shopping é gerida por sua filha e segue aberta) e o atual vice de futebol, Ercolino de Luca. Sua filha, Priscila, fechou as portas na unidade da Tijuca quinta-feira e desabafou em rede social.
“E assim acaba mais um projeto e sonho de vida. Hoje estou com uma mistura de sentimentos, mas com uma certeza: fiz tudo o que podia para seguir em frente. Cada canto dessa loja foi idealizado com amor, carinho e vontade de dar certo (…) Fechei o portão pela última vez e me segurei para não chorar”.
Se considerar romper com a SPR, o Vasco precisaria pagar multa de R$ 100 mil por cada loja aberta, o que hoje representaria mais de R$ 1 milhão. Mas essa não é a intenção do clube, que enxerga a parte positiva da nova queda para a Série B, a exemplo do que ocorreu em 2009.
– Tem essa propensão a alavancar por causa da Série B. As vitórias vão aparecer de novo, o torcedor vem junto na hora que precisa. Isso pode ser importante. Tanto que temos pedidos de várias partes do Brasil para abrir novas lojas – revelou Bernardo Pontes.
Fonte: GloboEsporte.com